Rastros de Ódio (1956), de John Ford

 


Na opinião de John Wayne (1907-1979), este décimo segundo filme com seu amigo e padrinho John Ford (1895-1973) era seu melhor filme. E a maior parte da crítica concorda com ele. 

Gostava tanto do personagem dele, Ethan Edwards que batizou seu terceiro filho como John Ethan. 

O segundo filho, Patrick Wayne, trabalha aqui fazendo o papel do Tenente Greenhill (ele faria outros filmes como o pai e teria uma modesta carreira de ator).

Foi dos primeiros filmes da ex-atriz infantil Natalie Wood (1938-81) já como adolescente (sua irmã na vida real Lana Wood a interpreta quando criança). 

Uma figura constante nos longas de Ford era Ward Bond (1903-60) que por essa época também ficou famoso na televisão com o seriado Caravana (Wagon Train).


Olive Carey, que faz a Sra Jorgensen é a viúva do astro de faroeste Harry Carey com quem Ford começou carreira e mãe de Harry Carey Jr (1921-2012), que também trabalhou com frequência com ele. Dizem que a cena final diante da porta que se fecha foi uma homenagem ao velho Carey. 

Ex-estrela do cinema mudo, Mae Marsh faz uma das mulheres do forte.

A obra foi rodada no Monument Valley, no Estado de Utah, na chamada “Terra de John Ford”, onde ele filmou nove de seus principais trabalhos. 

Apesar de ser considerado talvez o melhor filme do diretor, não foi indicado para qualquer Oscar. O jovem galã Jeffrey Hunter (1925-69) que fez mais dois outros filmes com Ford e estrelou Rei dos Reis para Nicholas Ray morreu num acidente caseiro caindo de uma escada (mas os boatos afirmam que o consumo de drogas estava envolvido). Depois Ford e Wayne ainda fariam mais quatro filmes juntos.

O mestre Ford praticamente deu ao western seu formato depois tradicional e seu timbre de qualidade com No Tempo das Diligências (Stagecoah, 1939) - até então os filmes do gênero eram fitinhas C de complemento de programa - e é um dos poucos cineastas de que se pode dizer que nunca fez um filme ruim. 

Modesto, simples, objetivo (se apresentava sempre “meu nome é Ford, eu dirijo westerns”), rodando sempre apenas o material que sabia que iam utilizar (para os produtores não poderem modificar nada na montagem), era um mestre da narrativa e do gênero. Mas este talvez seja seu melhor faroeste. 

Foi justamente em seu décimo segundo trabalho junto a Wayne, que ele lhe deu finalmente um personagem que lhe permitia crescer, mudar, se transformar, amadurecer e superar a quase paródia em que caiu no fim de carreira. Parece que Ford tinha consciência de que construía uma elegia ao gênero a partir do plano que abre (e depois fecha o filme). 

Filmado do interior de uma casa, uma porta se abre mostrando a pradaria e o deserto, o exterior para onde vai a família, percebendo a aproximação de um estranho, que vem a ser Wayne, voltando da Guerra Civil para reencontrar a família. 

Preconceituoso, rancoroso ainda com a guerra e com os índios (aceita com má vontade o filho adotivo da família que ele ajudou a salvar, simplesmente porque tem um quarto de sangue índio), ele percebe tarde demais que caiu numa cilada em que toda sua família será massacrada, com a exceção da filha mais nova Debbie. 

Durante cinco anos, ele e o sobrinho adotivo percorrerão a região em busca da garota.

Essa é a trama de um filme rodado em VistaVision (o processo widescreen que a Paramount inventou para competir com o Cinemascope) na paisagem espetacular de Utah que ele considerava sua verdadeira região, onde não chega a haver muitos conflitos entre brancos e nativos, é mais a trajetória de um homem que aos poucos vai ficando amigo do jovem parceiro, até a aceitação da sobrinha. 

E o filme se encerra da mesma forma que abriu, com todos entrando pela porta aberta, menos ele, que para sempre será um estranho, um outsider (e caminhando com aquele seu andar tão particular parodiado por Nathan Lane em Gaiola das Loucas/ Birdcage).

Ford gostava também de pintar um retrato da vida na fronteira, aliviando a tensão com situações humorísticas (a rivalidade com o reverendo, o romance do sobrinho com a namorada que dura cinco anos e ele chega justamente no momento em que ela está para se casar com outro, a mulher índia que o rapaz ganha de presente). Mas que só aumenta sua mítica. Este é um dos poucos westerns que nos envolve emocionalmente, talvez pelo próprio conflito de gerações (Jeffrey Hunter e seus olhos azuis brilhantes é de impressionante sinceridade, Vera Miles que faz o interesse romântico de Ethan nunca aproveitou a sorte de ser a favorita de Ford e Hitchcock). Talvez pela sua simples humanidade.


Rastros de Ódio (The Searchers)

EUA, 1956. 119 min. Produzido por C. V Whitney/Warner. Direção de John Ford. Roteiro de Frank S. Nugent a partir do romance de Alan LeMay. Fotografia de Winton C. Hoch. Música de Max Steiner. Elenco: John Wayne, Jeffrey Hunter, Vera Miles, Ward Bond, Natalie Wood, John Qualen, Olive Carey, Hank Warden, Henry Brandon, Harry Carey Jr., Walter Coy, Pat Wayne, Pippa Scott, Dorothy Jordan.


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