O primeiro Superman do cinema: a animação clássica dos irmãos Fleischer

 

Não foi nem Christopher Reeve, no clássico de 1978, e nem George Reeves, no filme produzido para divulgar a série dos anos 1950 ou Kirk Alyn nas matinês cinematográficas dos anos 1940. Na verdade, não foi nem um ator de verdade que encarnou pela primeira vez, nos cinemas, o maior super-herói do universo.

Criado por Joe Shuster e Jerry Siegel e publicado originalmente em 1938, na revista Action Comics #1, Superman teve um programa de rádio de bastante sucesso dois anos depois. O próximo passo natural seria levar o personagem às telonas. E foram dois irmãos judeus de origem alemã, Max e Dave Fleischer – criadores da rotoscopia, técnica de animação baseada em pessoas de verdade que revolucionou o gênero ao apresentar movimentos próximos da realidade – que ficaram incumbidos da missão. No currículo, tinham a criação da Betty Boopy e a produção dos desenhos animados do Popeye.

Procurados pela Paramount, inicialmente recusaram a ideia. Acharam que o estúdio desistiria quando pediram uma quantia alta. Que nada. Os produtores não só decidiram apostar na dupla como investiram um preço recorde para a época: US$ 50 mil apenas no episódio piloto, quatro vezes mais do que se costumava pagar. Ate então, as animações eram atrações menores nas matinês dos cinemas dos Estados Unidos. A programação costumava contar com programas jornalísticos e longas-metragens. Superman recebeu tratamento diferenciado e até trailer teve para divulgar sua chegada às telonas.

A série de curtas-metragens animados seria lançada em 1941. Foram 17 episódios ao todo – nove deles produzidos por Max e Dave. Os demais foram realizados pela Famous Studios, divisão de animação da Paramount, após a aquisição do Fleischer Studios naquele mesmo ano.

Superman (1941)

E quem vê o Superman atual, tanto dos gibis, do cinema ou do desenho animado, não imagina que o personagem, inicialmente, não voava, e não economizava tempo em socar os vilões.

Nas histórias, o homem de aço tem muito das tramas das histórias em quadrinhos da era Siegel & Shuster, onde ele é kryptoniano, mas não foi adotado por um casal de bons velhinhos e nem criado em Smallville/Pequenópolis. Quando chega à Terra, é recolhido por um taxista. Que o leva a um orfanato, onde passa sua infância. Além disso, seus primeiros voos ocorreram nesses desenhos – até então ele era “capaz de pular um prédio com um único salto”, tal qual dizia a locução.

Foi também na animação que surgiram as frases “Mais rápido que uma bala. Mais forte que uma locomotiva. Capaz de saltar um prédio com um só pulo”. As tradicionais “É um pássaro? É um avião?” vieram do rádio, onde Clark Kent e Lois Lane eram dublados respectivamente por Bud Collyer e Joan Alexander. A dupla seria escalada para dublar os personagens também neste seriado.

Antecipou o film noir dos anos 1940 ao usar sombra e contrastes. As cores saturadas remetem às capas de revistas pulp e personagens como O Sombra e The Spider.  

Repleto de vilões excêntricos, os episódios mostram a repórter (Lois Lane) atrás de uma grande reportagem e sempre envolvida no meio da ação, precisando ser salva pelo herói – O Homem de Aço (2013) investe nesse sentido.

Superman (1941)

Hoje em dia, os roteiros escritos por Seymour Kneitel e Izyy Sparber soam ingênuos, sem maior profundidade. Mas o tempo de duração de cada episódio não permitia maior aprofundamento. Porém, a animação foi revolucionária: era muito bem desenhada, continha boas cenas de ação, retratava com certa fidelidade a Nova York daqueles tempos e seus arranha-céus, e, diferente de tudo o que era feito na área, apostava em planos grandiosos, com multidões em cena.

O primeiro capítulo, simplesmente chamado de Superman (e depois denominado O Cientista Maluco) foi indicado ao Oscar de Curta-Metragem de Animação no ano seguinte. Sobre o segundo episódio, Superman Contra os Monstros Mecânicos, há quem diga que a história teria influenciado o genial cineasta japonês Hayao Miyazaki  (A Viagem de Chihiro) em uma cena de Laputa: Castle in the Sky (1986) e que Capitão Sky e o Mundo do Amanhã (2004) faz referência à animação. Não faltam histórias cujos vilões são sujeitos inescrupulosos, resquício da Grande Depressão dos EUA pós Quebra da Bolsa de Nova York em 1929, e japoneses, os inimigos do país na Segunda Guerra Mundial. Estes são retratados de maneira extremamente caricata, à mesma maneira que seriam mostrados na primeira versão do Batman no cinema, na cinessérie O |Morcego, de 1943. Era o cinema usado para a Propaganda de Guerra, movimento também usado nos gibis. 

Inicialmente, parte da coleção chegou ao Brasil no DVD Superman em a Humanidade em Perigo, da NBO Editora, dentro da série de lançamentos Kids Collection.  Depois, a obra foi lançada completa num DVD duplo da Classicline. E está disponível no YouTube.

Sua influência é imensurável e foi a cartilha para as celebradas animações da Warner nos anos 1990, começando por Batman: A Série Animada e depois Superman: A Série Animada e, finalmente, a Liga da Justiça. O próprio Bruce Timm reconhece isto em um documentário que integra os extras da lata com a coleção em DVDs do personagem. As Novas Aventuras do Superman, de 2023, lançada diretamente no HBO Max, também homenageia a animação clássica. Uma obra-prima muito à frente de sua época.

Superman
Superman. 
EUA. 1941 a 1943. 
Direção: Dave Fleischer. 
Com vozes de Bud Collyer, Joan Alexander. 
144 minutos, divididos em episódios de 10 minutos cada. 






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