O diretor Christopher Nolan (do espetacular Amnésia, 2000), de carreira em ascensão, escreveu o roteiro em parceria com David S. Goyer (Blade) e realizou Batman Begins, uma produção absolutamente digna do personagem, dando uma “cara real” à história de Batman, contando sua origem de forma muito próxima daquela narrada nas histórias em quadrinhos.
Se nos filmes de Tim Burton Batman era praticamente um personagem secundário, já que os vilões tinham bastante tempo em cena e suas trajetórias muito mais desenvolvidas, dessa vez houve uma preocupação de fã em contar de forma detalhada a criação do Cruzado de Capa – e Batman só aparece uniformizado com mais de uma hora de projeção.
Ao contrário das carnavalescas produções de Joel Schumacher, foi pensada uma trama sombria, mostrando uma Gotham City dominada pelo tráfico de drogas (cujo chefão é Carmine Falcone, interpretado por Tom Wilkinson), sob a mira da Liga das Sombras (que tem o intuito de reestruturar a cidade, destruindo-a antes) e onde os bandidos acabam sob a “psicologia” do Espantalho (Cillian Murphy). Além disso, cada equipamento, como a Batcaverna, ganhou uma explicação plausível – dentro do contexto do filme – para existir.
O desenvolvimento foi tal que os criadores do longa puderam deixar o Coringa para o filme seguinte. E Nolan ainda conseguiu aliar ao apuro técnico (escudado por orçamento de US$ 135 milhões) à reunião de um elenco fabuloso, com atores consagrados e outros jovens de talento.
Christian Bale, até então o melhor ator a incorporar o papel, despontou em Império do Sol (1987), de Steven Spielberg. Em O Operário (2004), perdeu muitos quilos e sua aparência chocou a audiência. Para Batman Begins, Nolan pediu ao ator que ganhasse massa muscular. Bale, acostumado a mergulhar de corpo e alma nos personagens, ficou forte demais e depois precisou perder alguns quilos para entrar no traje. Seu Batman transmite ao espectador todas as camadas de sentimentos e conflitos vividos por Bruce Wayne. Quando veste o manto para combater o crime, muda sua voz – a princípio, a “rouquidão” de Batman incomodou algumas pessoas, mas foi melhorando filme a filme.
Nolan, assim como Richard Donner fez com Christopher Reeve em Superman (1978), cercou Bale por um timaço de atores: Morgan Freeman, na pele do conselheiro Lucius Fox, Gary Oldman perfeito como o então Tenente Gordon, Michael Caine dando show no papel do mordomo Alfred, Katie Holmes (o único porém no cast) vivendo o interesse romântico, a promotora Rachel, criada especialmente para o cinema, Liam Neeson interpretando magistralmente Henri Ducard, responsável pelo treinamento de Bruce Wayne, Tom Wilkinson divertindo-se como mafioso Carmine Falcone, Rutger Hauer fazendo o executivo pilantra Richard Earle, Cillian Murphy esbanjando insanidade sob a máscara do Espantalho e Ken Watanabe (O Último Samurai e Cartas de Iwo Jima) dando vida a Ra’s Al Ghul. Alguns personagens não são quem parecem ser. Não vamos estragar a surpresa para quem ainda não viu a história.
Entre as influências cinematográficas, a mais notável é Blade Runner (1982), de Ridley Scott. Nolan pediu à sua equipe para se basear na Los Angeles futurista daquele filme para a criação de Gotham City. Fator visível quando vemos Gotham do alto, suas luzes e sombras (em fotografia indicada ao Oscar). A presença de Rutger Hauer, que viveu um Replicante em Blade Runner, reforça a reverência de Nolan.
O roteiro, extremamente bem desenvolvido, baseia-se livremente nas histórias em quadrinhos Batman Ano Um, O Longo Dia das Bruxas, O Legado do Demônio e nas tramas dos anos 70 de Neil Adams e Dennis O’Neil.
Já o espectador voltou a sentir tensão e acompanhar de perto as aventuras do herói graças à competente trilha sonora de James Newton Howard e Hans Zimmer.
Depois de Batman Begins o cinema de super-heróis tomaria outro caminho. Os produtores passaram a acreditar que era possível fazer um filme do gênero sem idiotizá-lo e ainda assim atrair o grande público. Atores e diretores consagrados passaram a prestar atenção nesse tipo de projeto e fãs dos quadrinhos puderam comemorar. Tudo isso seria intensificado na continuação O Cavaleiro das Trevas (2008).
Batman Begins
EUA, 2005.
Direção: Christopher Nolan.
Com Christian Bale, Morgan Freeman, Gary Oldman, Michael Caine, Katie Holmes, Liam Neeson, Tom Wilkinson, Rutger Hauer, Cillian Murphy, Ken Watanabe.
134 min.
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