Crítica | Passagrana diverte em filme de assalto disfarçado de filme sobre a produção de um filme de assalto


Com trama familiar à primeira vista, Passagrana logo deixa claro que não está aqui para seguir os clichês usuais dos filmes de assalto. Dirigido escrito pelo ator Ravel Cabral, o longa é uma lufada de ar fresco para quem já cansou de ver golpes mal planejados e policiais corruptos em situações pra lá de previsíveis.

A história segue quatro amigos ferrados – Zoinhu (Wesley Guimarães), Linguinha (Juan Queiroz), Mãodelo (Elzio Vieira) e Alãodelom (Wenry Bueno) – que sobrevivem nas ruas de São Paulo dando pequenos golpes. No entanto, ao se meterem com um policial corrupto, implacável e líder de uma gangue, interpretado por Caco Ciocler, eles se veem forçados a bolar um plano arriscado para escapar. E qual a solução deles? Assaltar um banco.

A sacada é que o plano não envolve apenas técnicas tradicionais de roubo: os amigos reúnem uma dezena de atores, incluindo as participações especiais brilhantes de Carol Castro e Irene Ravache, sob a desculpa de que estão gravando um curta-metragem. O detalhe? O filme é fictício. O assalto, não.

O grande charme de Passagrana está exatamente nessa metalinguagem deliciosa. Não é “apenas” um filme de assalto; é um filme de assalto disfarçado de um filme sobre a produção de um filme de assalto.


Além disso, está recheado de referências cinéfilas que só quem ama cinema vai pegar. Desde os diálogos até os nomes dos personagens, há homenagens a figuras como Domingos de Oliveira, Alain Delon, Anselmo Duarte, Glauber Rocha e até Lars von Trier.

Longe de ser uma piada estendida, Passagrana consegue equilibrar muito bem o humor e a tensão. A trilha sonora inquietante não deixa a gente relaxar por muito tempo, e os momentos cômicos, apesar de absurdos, vêm com uma naturalidade que cativa. Mérito do elenco, que torna a relação dos personagens crível. Wesley Guimarães (Zoinhu/Domingos), lidera o grupo com uma mistura de ingenuidade e teimosia que só piora as situações. Alãodelom é o amigo cheio de ideias mirabolantes, enquanto Linguinha (Juan Queiroz) e Mãodelo (Elzio Vieira) completam o quarteto com personalidades bem diferentes, porém de lealdade inquestionável. Juntos, esses personagens arriscam muito para tentar conquistar o que desejam.

Caco Ciocler, por sua vez, interpreta um vilão tão mau-caráter que, em certo ponto, você começa a torcer para ele ser enganado pelo grupo de atores que nem sequer sabe que está participando de um crime. Carol Castro, em uma de suas melhores performances, brinca com a própria imagem, criando cenas hilárias enquanto atua sem saber que está sendo parte do golpe. Giovanna Grigio faz o interesse romântico do protagonista, uma atriz que mergulha de cabeça no papel.

Passagrana também não deixa de prestar homenagem aos clássicos filmes de assalto. Há influências de Inside Man (O Plano Perfeito, 2006), de Spike Lee. O esquema montado pelos amigos mistura o planejamento detalhado e a execução imprevisível que fizeram do longa de Lee um marco no gênero.

Utiliza de forma inteligente os clichês, subvertendo expectativas e mantendo a audiência grudada na tela até o fim. É ousado e criativo.





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