À Procura de Eric (2009) e como a amizade e o futebol transformam vidas


Por André Azenha 

Nós brasileiros sabemos muito bem como o futebol serve para grande parte da população extravasar as dores do cotidiano. O dia está uma droga, mas uma vitória do time querido pode transformar tristeza em alegria.

Na Inglaterra não é diferente. E Ken Loach, cineasta engajado e um dos mais sérios e respeitados da terra da rainha, especialista em retratar as classes desfavorecidas daquele país, soube trabalhar com inteligência e bom humor a proposta de produtores franceses em filmar a relação do ex-jogador de futebol francês Eric Cantona e a torcida.

Pra ajudar o leitor, um breve resumo. Cantona jogou no Manchester United entre os anos 80 e 90. Polêmico e talentoso (pode ser considerado o Romário francês daquele período), ficou famoso pelos belos gols, como também por frases misteriosas e alegóricas, que deixavam jornalistas olhando uns para os outros nas coletivas de imprensa, e por certa vez ter partido pra cima de um torcedor, fato que o deixou nove meses sem poder jogar. O período longe dos gramados, ao invés de deprimi-lo ou deixá-lo fora de forma, serviu para que o atleta voltasse com mais vibração, e ajudasse o Manchester a exercer uma das maiores hegemonias na história do futebol europeu.

Mas ao contrário do que poderia ser esperado, Á Procura de Eric não é uma glorificação exacerbada da carreira de Cantona. O Eric do título serve tanto para retratar o jogador, como também o carteiro londrino Eric Bishop – interpretado por Steve Evets,  ex-integrante da banda inglesa The Fall e veterano ator coadjuvante que não é conhecido do grande público brasileiro.

Quando jovem, Bishop sofria ataques de pânico. E num deles, abandonou sem explicação a então namorada grávida. Décadas depois, já avô, precisa ajudar na criação da neta, pois a filha está na faculdade. Assim, tem que se reaproximar de seu antigo amor. Não bastasse isso, seu filho de um segundo casamento (ele mora com dois garotos, situação que não fica elucidada na trama) se envolve com um bandido em condicional.

Nesse lapso de perdição, Eric encontra ajuda nas palavras de… Eric Cantona, que se torna seu guru imaginário. Entre as conversas de Eric com Eric, claro, há futebol, e são mostrados vários gols de Cantona pelo Manchester.  Em determinado momento, Bishop pergunta qual o principal momento da carreira do ídolo. Um dos gols? Não. Simplesmente… um passe. Jogada que Cantona precisou confiar a um companheiro de clube, que terminou em gol. E é esse espírito de colaboração e camaradagem que faz Bishop dar a volta por cima.

Com interpretações divertidas, algum romance e tiradas certeiras, À Procura de Eric mostra a sociedade inglesa sem o glamour com o qual geralmente é mostrada no cinema. Principalmente, retrata como a amizade pode ajudar na superação de problemas, e o futebol, ou a paixão pelo esporte num âmbito geral, colabora para que tantas pessoas não desistam. Mas aqui o futebol não tem caráter manipulador. Funciona como um incentivo. Mesmo porque ninguém segue em frente sem atitude. E Cantona, que fez outros trabalhos no cinema (como Elizabeth, com Cate Blanchett) e convence como ator, é um cara de atitude.

À Procura de Eric, exibido na Mostra de Cinema de São Paulo em 2009 e vencedor do prêmio do Júri Ecumênico em Cannes, é lição de vida sem moralismos. Diversão inteligente, simples e eficiente, que tem tudo para agradar o brasileiro. 

À Procura de Eric
Looking For Eric
Reino Unido / França / Itália / Bélgica / Espanha, 2009.
Direção: Ken Loach. Roteiro: Paul Laverty Elenco: Steve Evets, Eric Cantona, Stephanie Bishop, Gerard Kearns, John Henshaw.
Comédia, Drama.
116 min. 

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